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IM Brasil: A jornada de Edson

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Piloto da Força Aérea Brasileira, Edson Monreal, de 32 anos, atleta da Equipe Márcia Ferreira, conta com detalhes como foi sua jornada no Ironman Brasil. A saga começa no dia em que decide avisar à família e aos amigos que vai fazer a prova e como será seu ano a partir daí. Confira!

Parte 1:  O anúncio, a inscrição e os treinos

“Mais um ironman. Mais um ciclo de vida que se completa. Como descrever 358 dias de treinos, planejamentos, treinos, cálculos, treinos, consultas, treinos, investimentos e mais treinos? Aliás, muitos treinos mesmo. Alguns dizem que quem completa um Ironman está querendo provar alguma coisa. Sinceramente, eu acho que no fundo, só queremos gritar pra nós mesmos que somos capazes de qualquer coisa. Provar pra nós mesmos que limites são coisas que a sociedade nos impõe. E por muitos anos aceitamos calados essas barreiras, como se fossem verdades absolutas.

Pois bem, cada um dos 2000 atletas inscritos tem sua história de vida e um trajeto percorrido até chegar na linha de largada. E geralmente não são histórias de sucessos esportivos. Pelo contrário, a maioria dos triatletas que eu conheço teve problemas sérios de saúde, desafios pessoais enormes e iniciar no triathlon foi como um recomeço de vida. Uma forma de mudar pra conseguir sobreviver a esse mundo. Por isso um ironman nunca será ‘só’ mais uma competição esportiva. É desafio e superação pessoal. E cada um que embarca nesse voo sabe que a viagem será dura e pesada, mas cruzar a linha de chegada, ouvir o narrador anunciar o seu nome e falar que você é um Ironman vale cada pedalada na bicicleta, cada passada na corrida e cada braçada na piscina dos inúmeros treinos.

Para ouvir essa frase, a decisão deve ser tomada muito tempo antes. Não é fácil chegar em casa e anunciar  isso. Praticamente todos os não-atletas que convivem comigo me desanimaram e disseram que isso era coisa de maluco. Começaram então as dificuldades: dar o pontapé inicial. E é a família que decide. Se você não tiver suporte deles, provavelmente não estará largando em Jurerê no ano seguinte. Vale prometer viagens e presentes pra conseguir o apoio. A segunda dificuldade acontece um ano antes da prova, durante a inscrição, onde a procura por vagas é muito maior do que a oferta e a disputa é acirrada. A estratégia para não perder o lugar na Start List é complexa, parecida com a de um fã comprando ingresso de um show do U2 ou Pearl Jam. Um celular, um tablet, um laptop, um computador e amigos de back-up. Tudo isso conectado na página do evento, aguardando o horário de início de vendas. Quando chega a hora prevista, inicia-se então a atualização insana da página do site em todos os dispositivos até que um deles consiga carregá-la e assim realizar a inscrição.

Feito isso, fiquei apto à terceira e maior etapa: técnica e fisiológica. Micro, meso e macro ciclos de treinos, conjugando provas intermediárias e pequenas janelas para folgas e férias. Prepare-se para 3 a 5 horas de treinos, de segunda a segunda. Madrugadas de terças, quintas e sábados significam treinos de ciclismo. Enquanto os velhos amigos curtem as festas e enviam fotos deles bêbados nos grupos de WhatsApp, os novos amigos enviam mensagens de ‘bom dia’ e ‘partiu pedal’ no grupo da equipe de triathlon. Se você acha cedo começar a pedalar às 4 horas da manhã, vai dar risada ao ficar na porta da academia às 6 horas da manhã, esperando abrir para poder fazer o reforço muscular.

Essa sequência de pedal e academia antes do trabalho, me fazia passar a manhã inteira com as pernas em estado de transe e praticamente inertes, sentado e imóvel na mesa do trabalho. Após o expediente, os treinos diários na piscina, somando por vezes mais de 25km por semana, me sugavam o restante de energia que ainda existia no corpo. Noites de quarta e sexta significam treinos de corrida e não mais happy hour com a galera do trabalho. Domingo, dia de praia e sossego? O tal dia que ‘até Deus descansou após criar o mundo’? Então, pra quem pretende completar um ironman é o dia do longão de corrida.

Qual modalidade é mais importante? Todas! Quem entra nesse mundo sabe que precisa nadar bem para poder pedalar com consistência. E precisa pedalar bem para poder começar a corrida com força nas pernas. E a corrida, ah… Esses 42km da maratona, após os 180km da bicicleta são pra acabar com qualquer um. Seja ele amador ou profissional. É na corrida que tudo se define. Onde todos os maiores desafios esportivos serão superados. Logo, precisa-se estar correndo muito bem. Por esses motivos que essa modalidade é a Fórmula 1 do triathlon. Onde os mais rápidos, utilizam os melhores equipamentos, sendo assessorados pelos melhores profissionais do esporte. Não existe espaço para amadorismo em uma prova dessa categoria. Até os amadores deixam de ser para poder completar esse ciclo.

E como treinar tanto, tendo que trabalhar e cuidar de uma casa, de uma família, de uma vida social? Olha, isso é tão difícil quanto os treinos. Minha família foi avisada com antecedência que eu ficaria mais ausente que o normal. Morando sozinho no Rio de Janeiro, tive que me virar para fazer mercado, cozinhar e cuidar da casa nos intervalos dos treinos. A namorada virou ex-namorada. Ao invés de eu visitar minha família e amigos, eles passaram a me visitar. No trabalho eu ganhei um novo apelido. Aliás, acho que todos passam a ser chamados de ironman mesmo antes de completar um. O pessoal passou a entender minha rotina de treinos e a conviver com um caminhar mancando as vezes. É até engraçado chegar às 8 horas da manhã pra trabalhar, já tendo pedalado e malhado desde as 4h da madrugada. A minha cabeça está acelerada enquanto a dos demais está começando a sair da inércia. São ritmos fisiológicos complemente diferentes. Depois do trabalho, quando todos reclamam de cansaço, eu vou pra piscina, nadar mais de 5 km entre tiros e educativos.

Tudo isso fez parte da etapa treinamento. Não posso esquecer da estrutura de profissionais por trás. Osteopatia pra colocar os ossos e músculos no lugar. Exames de sangue, ergoespirometria, consultas com médico do esporte, ortopedista, nutricionista. Falando nisso, aprendi a comer em grandes quantidades. Se algum dia você encher o prato e passar de um quilo na balança, vai me entender. E isso acontece todo dia. Toda essa logística técnica anual para chegar no dia da prova pronto.”

 

Parte 2:  A prova (ou ‘Uhuuu, vai filhão!’)

“A hora da largada é um momento especial. Nervos à flor da pele. Adrenalina de sobra correndo pelo sangue. Mistura de alegria, preocupação, concentração, medo. Quando enfim soa a corneta e aquela manada de elefantes estoura na direção da primeira boia do mar, que todos os sentimentos se resumem em um: sobrevivência. A pancadaria rola solta. Chute na boca, soco no olho, gente tentando te afundar, outros te empurrar e alguns te puxar. Por vezes tentar arrancar seus óculos ou o seu relógio. Alguns nadam em zigue e zague. Outros se desorientam e tomam a proa da Antártida (se não fosse o pessoal do apoio com o caiaque pra orientar, acho que chegariam lá mesmo).

Até tentei encaixar a técnica perfeita da braçada, respiração, pernada, mas sinceramente, o sentimento de sobrevivência foi mais forte durante toda a primeira volta. Só queria concluir vivo. É muita gente largando junto e tentando percorrer o caminho mais curto até a bóia. Já a segunda volta é mas tranquila, pois os atletas ficam mais escalonados e a densidade de atleta por metro quadrado é menor. Por vezes senti uma pontada de câibra no plantar, mas nada perigoso. Segundo meu gps de pulso, nadei 350 metros a mais, provavelmente devido a navegação não tão eficiente quanto gostaria, mas conversando com outros atletas no pós-prova percebi que fui até bem perto de outros que nadaram 700 metros além.

A transição (T1) da água para a bicicleta é mais demorada. Todos te orientam no caminho, tem gente da organização que te ajuda a tirar a roupa de borracha, outros que te oferecem água, gatorade, refrigerante. Na verdade eu só queria colocar meu capacete e sair pedalando, mas uma transição bem feita é a chave do sucesso nos próximos 180km na bike. Após pegar a sacola do ciclismo, sentei e comecei a sequência: Toalha de rosto pra secar a pele. Protetor solar no rosto, ombros, braços e pernas. Mais uma ingestão de gel de carboidrato. Pegar óculos, capacete, encher os bolsos com gel, colocar a roupa de borracha pra dentro da sacola, jogar essa num bolo de sacolas e sair correndo pra pegar a bike. Aproveitei pra comer uma bisnaguinha, tomar um pouco de gatorade e passar no banheiro químico pra aliviar a bexiga.

Feito isso, olhar para aquele mundo de bicicletas e encontrar a sua é até engraçado. Peguei a minha, conferi pressão nos pneus e corri com ela até a área de montagem. Pisei em uma sapatilha, sentei no selim e comecei a segunda modalidade.

A torcida ali em Jurerê é impressionante. Gritaria de todo tipo. Famílias, namorados, namoradas, filhos, amigos, técnicos… Eu só queria ver os meus pais e consegui. Minha mãe bradava incessantemente meu nome e com gritos de ‘Uhuuu’ me empurrava pra frente. Meu pai não sabia se tirava foto ou se gritava ‘vai filhão’.  Acho que fez os dois… Até chegar na estrada é preciso ficar atento pra não atropelar nenhum espectador, pois são muitos mesmo. Dizem que são mais de 10 mil. Bom, não contei, mas era muita gente espalhada pelas ruas. Ah, e os fotógrafos que se espalham pelo meio da rua. Quase passei por cima de uns dois que estavam sentados no meu caminho.

Ao chegar na pista de acesso à estrada a história muda e você descobre quem é quem. Como minha base de ciclismo foi boa, passei praticamente as 5 horas da modalidade pedindo licença e ultrapassando a galera. Vácuo não é autorizado, mas perdi as contas de quantos pelotões eu passei. E esses sanguessugas vinham na minha roda. Era difícil me livrar deles. As vezes alguns pelotões fechavam a faixa inteira e não havia nem espaço pra ultrapassagem. Cheguei a passar pela faixa dos carros, fora dos cones de segurança, pra poder me livrar deles. Memorizei o número de alguns atletas que às vezes apareciam na minha roda. Um deles até conseguiu vaga pro mundial no Havai. Coisa feia eu falava ao ultrapassá-los mas eles não se intimidavam e continuavam colados roda com roda. Bom, os fiscais até apareciam, mas não conseguiam fiscalizar 100% do percurso.

O vento por vezes segurava, em outras me empurrava. Subidas longas e bem inclinadas, onde se escuta atletas xingando até a quinta geração da coitada da subida. Descidas velozes e perigosas. Atingi 70km/h em uma delas. Hidratação e nutrição contados na ponta do lápis e disciplinados pelo relógio. A minha média que estava em 36km/h caiu na segunda metade da prova e fechei com 35.4km/h. Abaixo do planejado, mas de acordo com minha estratégia de “sentir o corpo” e não seguir as metas de velocidade planejadas.

Mais uma transição (T2). Tudo de novo. Aquela mesma tenda, mesmo caminho. Larguei a bicicleta com o pessoal da organização e corri pra pegar a sacola da corrida. Troquei o capacete pelo boné, os sachês usados de gel por novos nos bolsos laterais do shorts, vesti meias e tênis, peguei a cinta com meu número e saí correndo. Ainda na tenda, comi outra bisnaguinha com gatorade, passei no banheiro pra aliviar a pressão na bexiga e quando me dei conta, já estava na área externa, procurando meus pais no meio daquela multidão de ironfamily, ironwife, ironkids, ironfriends… Encontrei só dois e eles repetiram a cena. Minha mãe gritando ‘uhuuu’ e meu pai tirando fotos enquanto falava ‘vai filhão’.

Comecei tão adrenado a corrida que quando olhei no gps de pulso vi que estava correndo leve e com um pace de 4:22/km. Aliviei a puxada, mas não conseguia correr pra meta de 5:22/km. Sempre abaixo de 5/km. Sabia que uma hora iria pagar o preço. Logo chegaram as ladeiras de Canasvieiras. Caminhei sem medo nas subidas. É engraçado ver as pessoas que moram na ladeira fazendo churrasco na calçada, tomando cerveja, dançando com uma música alta e incentivando os atletas.

Após diversos sobe-e-desce, do quilômetro 4 ao 13, chega a parte plana. Quando tentei aumentar o ritmo pra 5’/km, minha panturrilha me lembrou que ela já se lesionou três vezes nas últimas três maratonas e aliviei pra 5:30/ 5:40/Km. E assim foi a primeira metade da corrida. Tomei água em todos os postos de hidratação. Mesmo que só um gole. Mantive a estratégia de um gel a cada 45 minutos e por vezes ingeria pedaços de bolo e bisnaguinha dos postos de comida. É importante comer algo sólido pra não ficar com estômago enjoado. Ao passar pela Av Búzios novamente, onde toda a torcida se concentrava, não encontrei meus pais, mas outros conhecidos e conhecidas gritavam meu nome e eu devolvia com um jóia ou um “V” com os dedos. Algumas crianças ficam com as mãos espalmadas, esperando os atletas baterem nelas. Não consigo deixar uma criança ‘no vácuo’. Sempre tento devolver o carinho delas. Bati em todas as mãos que apareciam na minha frente. É impressionante como correr com torcida é diferente. É como se a gente parasse de sentir as dores e o cansaço extremo. O peito fica cheio, a postura fica de vencedor e as passadas ficam largas. Mas difícil mesmo é manter isso depois que sai da multidão.

Lá na estrada, onde não tem torcida. É lá que a gente vê quem se preparou direito ou não. Bom, mais uma volta de 10km e eu gerenciando minha panturrilha, que não doeu, mas por vezes me incomodava. Lá pelo quilômetro 30 comecei a sentir as laterais da minha coxa. Era como se eu não conseguisse aplicar a força que eu queria. Estranho se dar conta que nem sempre seu cérebro tem total controle sobre seus próprios músculos do corpo. Bom, ao passar pelo quilômetro 35 eu sabia que iria completar e pelas minhas contas, chegaria próximo a 10 horas e 20 minutos de prova. Isso acontecendo, eu realizaria um sonho que tenho desde 2012: chegar de dia.

Logo, comecei a sentir uma força extra nas pernas, que eu tinha que controlar pra não forçar a passada e acabar me lesionando no final. Inverti o raciocínio. Ao invés de faltar força nas pernas, eu tinha que diminuir ela. Complicado, não? Pois bem. Aumentei aos poucos o ritmo e ao passar pelo quilômetro 38 não me segurei mais. Abri a passada e quando avistei o Campanário (um ponto de referência na Av Búzios) me soltei de vez. Mantive um ritmo abaixo de 5’/km e um sorriso estampado no rosto. Ver aquela multidão gritando, me incentivando, as crianças com as mãozinhas espalmadas de novo e o sol se pondo, me fez sentir um frio na barriga, um arrepio no corpo todo, uma emoção sem igual e uma felicidade como há tempos não sentia.

No quilômetro final eu estava correndo na mesma velocidade de um tiro de 600m na ciclovia do Aterro do Flamengo. Parei de olhar pro relógio e passei a curtir o momento. Olhava em volta e me emocionei de verdade. Quase chorei de alegria. Mas não dava tempo disso, tinha que encontrar meus pais pela última vez. Logo ouvi minha mãe emocionada, gritando por e pra mim. Mandei um beijo pra ela e meu pai capturou esse momento com a câmera fotográfica dele. Talvez a foto mais bela que tenho nesses três ironman que completei. Passou a vontade de chorar. Precisava passar pelo pórtico de chegada ainda. Passadas largas, leve como um início de treino, peito cheio, sorriso estampado, felicidade transbordando e um sentimento de dever cumprido. Cheguei nos tapetes azuis. O narrador chamou meu nome e nessa hora abri os braços, muito emocionado e agradecendo a Deus e a todos que fizeram parte disso, e ele disse: “parabéns Edson Monreal, você é um ironman!”. Dei um pulo na linha de chegada como se fosse o vencedor da prova. Longe disso, mas foi uma vitória pessoal. Um sonho que se realizava. Um ano de trabalho, dedicação, abnegação, disciplina, paciência, persistência entre outras coisas. Por muitas vezes foram mais horas treinando do que dormindo por dia. Se você teve a paciência de ler até aqui e sentiu um frio na barriga, uma vontade de completar uma prova dessas, me desculpe, mas o bichinho do ironman te picou. É questão de tempo pra você se inscrever. Seja bem vindo!”

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